Generosidade Alterista e Economia do Cuidado: Um Novo Paradigma para a Inclusão Feminina no Mercado de Trabalho

Por Cris Zanata
Recentes dados do IBGE trouxeram à luz uma realidade preocupante: mais de 2,5 milhões de mulheres não estavam trabalhando em 2022 devido a responsabilidades de cuidado com familiares e afazeres domésticos. Essas mulheres fazem parte do total de quase 7 milhões, de idades entre 15 e 29 anos, que não estudavam nem estavam ocupadas em 2022. Esses números ecoam desigualdades profundas e ressaltam a importância de repensar a participação feminina no mercado de trabalho à luz da generosidade alterista. Mas, afinal, o que é generosidade alterista?
A generosidade alterista propõe uma nova forma de doação e apoio mútuo, sem comprometer os próprios interesses. Esse princípio ganha relevância crucial ao analisarmos como a sociedade foi estruturada para relacionar o trabalho do cuidado doméstico e familiar a uma responsabilidade feminina.
A destacada quantidade de mulheres que apontaram o cuidado com familiares ou tarefas domésticas como motivo para não ingressar no mercado de trabalho não é mera justificativa, mas uma manifestação de uma questão histórica e estrutural. Esta realidade reflete um legado social que historicamente incumbiu às mulheres a responsabilidade primária pelo cuidado familiar, impondo essa expectativa como um dever.
Nesse contexto, elas se veem pressionadas a atender a essa necessidade socialmente imposta de cuidar das pessoas, um peso que gera um sentimento de culpa caso não consigam cumprir integralmente com essa função, deixando em segundo plano sua carreira profissional. A discrepância entre os números de mulheres, mais de 2 milhões, e homens, cerca de 80 mil, que deixaram o mercado de trabalho por motivos semelhantes evidencia a sobrecarga desproporcional de responsabilidades enfrentada pelas mulheres neste contexto.
A generosidade alterista apresenta uma nova abordagem para superar esse desafio, permitindo um equilíbrio mais justo entre o cuidado familiar e a participação no mercado de trabalho. Ao adotar essa perspectiva, há o potencial de criar um ambiente mais equitativo, onde as mulheres possam contribuir economicamente sem sacrificar completamente sua dedicação ao cuidado.
Esse conceito, além de oferecer uma abordagem mais consciente de doação e apoio, poderia reduzir a sobrecarga de responsabilidades sobre as mulheres, pois ajuda também os homens a compreender sua posição como parte neste trabalho de cuidados. Sua aplicação estratégica pode representar não apenas uma mudança cultural, mas também um avanço significativo em direção a uma economia mais inclusiva e equitativa.
Como as mulheres podem aplicar os princípios da generosidade alterista em suas vidas diárias, especialmente quando se trata de equilibrar responsabilidades de cuidado e avançar em suas carreiras? Esse é um ponto crucial e prático ao considerarmos a influência desse conceito na realidade feminina.
Autoconhecimento e Equilíbrio: O primeiro passo é o autoconhecimento. As mulheres podem refletir sobre suas próprias prioridades e limites, identificando onde desejam direcionar suas energias, seja na carreira, no cuidado familiar ou em ambos. O equilíbrio entre esses aspectos se torna mais viável quando se compreende a importância de atender às próprias necessidades, além das demandas externas.
Definir Limites e Dizer Não com Respeito: A generosidade alterista não implica em se sobrecarregar. As mulheres podem aprender a estabelecer limites saudáveis, dizendo “não” com respeito e consideração, sem se sentirem culpadas. Isso implica em reconhecer suas capacidades e limitações, evitando o esgotamento ao se comprometerem excessivamente.
Priorizar as Demandas e Negociar Apoio: É crucial priorizar as demandas. Mulheres podem aprender a negociar apoio, seja na divisão de tarefas domésticas ou na busca por recursos que facilitem o cuidado familiar, permitindo assim um espaço maior para investir em suas próprias ambições profissionais.
Estabelecer Redes de Apoio e Solidariedade: A generosidade alterista incentiva a construção de redes de apoio. As mulheres podem buscar comunidades e grupos que ofereçam suporte mútuo, compartilhando experiências e aprendendo umas com as outras, criando assim uma base sólida para avançar tanto no âmbito profissional quanto pessoal.
Advocacia e Educação Contínua: Além disso, é fundamental advogar por si mesmas. As mulheres podem buscar oportunidades de educação e desenvolvimento contínuo, procurar por mentoria e orientação, fortalecendo suas habilidades e ampliando suas possibilidades de crescimento no mercado de trabalho.
Ao colocar em prática esses conceitos da generosidade alterista, as mulheres podem encontrar um caminho mais equilibrado e empoderado. Essa abordagem oferece não apenas uma visão mais consciente do cuidado e da participação no mercado de trabalho, mas também proporciona ferramentas práticas para enfrentar os desafios e avançar em direção a uma vida mais plena e realizada.
Sobre Cris Zanata
Fundadora do Instituto de Alterismo do Brasil (InsAB), Conselheira de diversidade, equidade e inclusão na RSU Lixo Inteligente e mestranda em Gênero e Diversidade pela Universidade de Oviedo, na Espanha. Trabalhou durante 18 anos em cargos de liderança em Big Four e empresas do setor privado na área de impostos aduaneiros e logística, alcançando o cargo de diretora global de logística em uma empresa de energia renovável espanhola. Atualmente é pesquisadora sobre inovação social, equidade de gênero e generosidade nas organizações e facilitadora em projetos realizados por Carlotas na Alemanha para mulheres migrantes.