24/12/2024

O tempo do Natal estabelece a necessidade, talvez até obrigação, de ampliar a temática habitualmente delimitada aos alfarrábios jurídicos. Como escritor, sinto a necessidade de utilizar as linhas e o universo do texto para refletir temas que me são caros e, sobretudo, parecem prementes no atual cenário da humanidade. O constante movimento consumista trouxe, em 2024, um dos períodos natalinos mais angustiantes de todos os tempos, deflagrando uma verdadeira corrida desesperada por valores e bens, em escalonada elevação.

Potencializado pelo universo paralelo das redes sociais, muitos acabam fazendo um movimento inverso e, mais preocupados em ostentar momentos de suas sempre pujantes experiências, acabam esquecendo da profunda espiritualidade do Natal. No intento de mostrar os feitos e o luxo de suas mansões, presentes, carros ou, até mesmo a cinematográfica viagem de férias, uns acabam despertando nos outros frustrações, muitas vezes, oníricas, em efeito duplamente negativo experimentado pelos dois lados. De um lado, o sofrimento inerente à discrepância entre a realidade e a ilusão exposta. De outro, a difícil tarefa de suportar a implacável vida real, bem como explicar a si próprio e à família, tentando evitar sentimentos negativos, como diminuir o que se conquistou ao comparar o que se, virtualmente, acredita existir.

E esse movimento, infelizmente, tem transformado o amor em um sentimento objetivo, cada vez mais direcionado por caracteres de origem racional. Noto que estamos caminhando para tempos em que os sentimentos caminham em direção à utilidade, ou à reciprocidade remuneratória. Mesmo após 2024 anos do primeiro Natal, a tendência é amar aqueles que “merecem” ser amados. Com facilidade, amam-se os amáveis, os afáveis, os que tudo fazem para nos agradar e tornar mais belo e mais suave nossos caminhos. E é exatamente esse amor vazio e desconexo que tem dominado os últimos tempos. Um amor que precisa da via oposta para persistir, bem diferente do Ágape, o verdadeiro amor que nos ensinou Jesus.

Esse amor verdadeiro, tão raro nos dias de hoje, pressupõe o sentimento e suas respectivas atitudes além daquele que será o seu destinatário. Universal e aplicável a todas as relações humanas, mas que esteja acima da reciprocidade. Desejo que, neste Natal, sejamos capazes de experimentar a ceia espiritual do nascimento do Senhor em nossos corações, tornando-nos cada vez mais próximos da capacidade de amar além e apesar dos limites da pessoa amada. Apenas assim deixaremos o Natal acontecer em cada um de nós.